DO R7
Dois dias após o Brasil decidir nas urnas seu novo
presidente, eleitores ressentidos com o resultado da eleição usam as redes
sociais para disseminar manifestações de ódio contra os nordestinos — onde
Dilma Rousseff (PT) venceu Aécio Neves (PSDB) em todos os Estados.
Supostamente, a região teria dado a vitória à petista — mas o desempenho de
Dilma no Sul e Sudeste foi fundamental para o triunfo.
Nesta terça-feira (28), as mensagens foram desde o singelo
‘destruíram nosso País’ até desejos mais agressivos, como ‘que o ebola chegue
ao Brasil pelo Nordeste’. Em um vídeo, uma mulher, supostamente rica, chama os
eleitores de Dilma de "miseráveis, imbecis e burros" (assista
abaixo).
Os protestos surgiram logo após o resultado no domingo,
quando surgiram mais de 300 páginas para promover discriminação contra os
nordestinos. O vereador de São Paulo Coronel Paulo Telhada (PSDB) sugeriu, no
Facebook, a independência do Sul e do Sudeste e recomendou que Norte e Nordeste
“paguem o preço sozinhos” pela eleição de Dilma. Telhada foi eleito deputado
estadual em SP com 254 mil votos.
Em resposta à onda de discriminação contra o Nordeste o
jogador da seleção brasileira Hulk pediu, via Instagram, respeito ao Nordeste.
Apesar dos ânimos exaltados, cientistas políticos ouvidos
pela reportagem do R7 apostam que o ódio disseminado nas redes sociais deve
passar logo. O professor da Fesp (Fundação Escola de Sociologia e Política de
São Paulo) Aldo Fornazieri explica que “terminada a eleição não se pode partir
para um terceiro turno, de vingança”.
— Não há entre a população, com exceção de setores
minoritários e radicais que espalham ódio e preconceito contra pobres,
nordestinos, negros e mulheres, não há um clima de animosidade política. A
tensão que acompanhou o processo eleitoral está se desfazendo.
[Nordestino, jogador Hulk pediu respeito às declarações
contra o NE]
O professor lembra que “há uma acomodação natural e uma
aceitação natural dos resultados”, mas alerta que “é preciso ter cuidado com
esses setores minoritários de caráter neofascista que pregam a violência”.
O professor de ciência política da UFMG (Universidade
Federal de Minas Gerais) Carlos Ranulfo classifica as manifestações contrárias
aos nordestinos nas redes sociais como uma “histeria”. O especialista lembra
que “tem pessoa dizendo que vai sair do País, que vai mudar para Miami”.
— Acho que isso é uma histeria que foi insuflada pela
campanha do PSDB, porque botou na cabeça de uma classe média muito
mal-informada, que se acha informada, que o PT vai instalar uma ditadura, que
vai fazer isso e aquilo. Ou seja, tem um monte de coisa sem nenhum sentido e as
pessoas saem repetindo bobagem e um monte de asneira sobre o Nordeste.
Ranulfo ressalta que “Aécio perdeu em Minas, que não é no
Nordeste, perdeu no Rio de Janeiro”. Por isso, as acusações contra os
nordestinos, segundo ele, “não têm nenhum impacto e vão esfriar”.
— O que interessa é como as forças políticas brasileiras vão
reagir: o Congresso, a Câmara, o Senado, os movimentos sociais, as atitudes da
presidente, como vai ser a recomposição na Câmara na questão da presidência.
Essa exteriorização de comentários não tem a menor importância que se dá.
Panos quentes
No domingo à noite, após o TSE (Tribunal Superior Eleitoral)
divulgar os resultados das eleições presidenciais, tanto Aécio Neves (PSDB)
como Dilma Rousseff (PT) adotaram um tom mais sereno e ambos falaram em
“união”.
Fornazieri, da Fesp, destaca que, apesar do discurso
conciliador de Aécio, “o PSDB tem responsabilidade no sentido de se manifestar
contra essas posições [contrárias aos nordestinos]”.
— O PSDB, enquanto partido democrático, que ajuda a
construir a democracia no País, tem o dever de desmentir essas minorias
radicais. Caso contrário, pode ser acusado de conivência com essas
manifestações de radicalismo.
Carlos Ranulfo, da UFMG, considera ambos os “discursos
previsíveis, sobretudo o da Dilma”, já que ela teve “uma vitória apertada e não
pode sair cantando de galo, dizendo ‘eu vou arrebentar’”.
— Ela tem que reconhecer que vai governar o País numa
situação não só complicada do ponto de vista econômico, porque o eleitorado
também se dividiu. Quer dizer, uma parte do País, 48%, não queria que ela
continuasse. [...] O governo não vai ter folga nenhuma. [...] Ela não vai ter
trégua. [...] Portanto, 2015 será um ano difícil tanto na economia como na
política.
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