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O espírito da bandeira

Texto do Senador Cristovam Buarque

Nessas últimas duas semanas, o mundo viu a bandeira do Brasil ser hasteada 161 vezes, no pódio dos jogos pan-americanos. Para surpresa de muitos, nossa bandeira, diferente do modelo tradicional, traz um texto escrito.

Em muitos países, o telespectador não tinha a menor idéia do que queriam dizer as duas palavras; muitos outros, por terem alfabetos diferentes, ou por serem analfabetos, não sabiam sequer que aqueles símbolos eram letras.

Em 1889, depois de terem derrubado o imperador Pedro II, os republicanos desenharam a nova bandeira do Brasil e nela escreveram “Ordem e Progresso”. Discutiram longamente a posição correta na qual colocar cada estrela, sem perceber a insensibilidade do ato de escrever um texto na bandeira de um país com 65% da população analfabeta.

Apesar de republicanos, escolheram uma bandeira para ser reconhecida por apenas 35% dos adultos, 6,3 milhões de brasileiros deixaram de ser considerados cidadãos, ficaram sem bandeira.

Quase 120 anos depois, em pleno século XXI, a taxa de analfabetismo caiu para 13,6%, mas o número absoluto quase triplicou: 16 milhões de brasileiros são incapazes de reconhecer a bandeira brasileira. Para eles, seria o mesmo se as letras fossem misturadas aleatoriamente ou trouxessem outra mensagem.

Se, desde então, as letras dissessem “Educação é Progresso”, certamente hoje os brasileiros já seriam capazes de ler e escrever, e de reconhecer a bandeira nacional. Todos teriam concluído o Ensino Médio com qualidade, milhões estariam em boas universidades e o Brasil estaria na vanguarda científica e tecnológica.
Já teríamos derrubado o muro da desigualdade, que nos divide socialmente, e o muro do atraso, que nos separa dos países modernos.

O lema Educação é Progresso teria criado uma consciência nacional pela educação, derrubado a indiferença com que a educação é tratada na nossa república: os pobres pensando que escola de qualidade é direito exclusivo dos filhos dos ricos, e os ricos achando que não é preciso dar boa escola aos filhos dos pobres.
Ficam para trás os filhos dos pobres, sem escola de qualidade, e fica para trás o País, em eterno atraso civilizatório, por falta de educação de qualidade para todos.

Mas os republicanos brasileiros eram parte de uma elite que não respeitava o povo pobre, recém-liberto da escravidão. Para eles, o “progresso” era para poucos, a “ordem” era para deixar as massas excluídas, dos benefícios.

A saída encontrada para garantir progresso com exclusão social sem uso da violência foi excluir os pobres do acesso à educação. E assim se faz há 120 anos, sem que se aponte o único caminho para a emancipação do povo e do país: a escola igual para todas as crianças.

Isso não interessa aos que desejam manter seus privilégios. A elite que escreveu “ordem e progresso” não vai escrever “educação é progresso”. Só a mobilização da população vai direcionar os recursos nacionais para a construção de uma nação com educação de qualidade para todos.

Escrever “Educação é Progresso” no lugar do velho lema da bandeira é uma provocação, para despertar a consciência nacional, especialmente das massas excluídas pela falta de acesso à educação de qualidade.

Não se trata de mudar a bandeira, mas de revigorar seu espírito, para que ela mobilize a nação pelo progresso para todos.

Se você quiser ajudar essa luta pela igualdade da educação, divulgue a bandeira com seu novo espírito. Tente convencer os pobres de que isso é possível, e os ricos de que isso é preciso. Porque educação é progresso, e só educação é progresso.

Convença os outros de que a consciência e a mobilização do povo são as armas para fazer uma revolução que assegure educação com a mesma qualidade tanto para os filhos de ricos quanto para os filhos de pobres.

Essa revolução pela educação igual para todos levará à justiça e à eficiência, assegurando a toda criança brasileira, desde o seu nascimento, a mesma chance de construir o seu futuro e o futuro do Brasil.

Cristovam Buarque é senador pelo PDT do Distrito Federal

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