Que a eventual eleição de Donald Trump seria ruim para o Brasil e para a América Latina parece tão óbvio que a esmagadora maioria dos latino-americanos votaria por Hillary Clinton, se pudesse.
É o que mostra pesquisa de meses atrás da Ipsos Public Affairs com 393 líderes de opinião de 15 países do subcontinente.
No Brasil, o resultado é 90% para Hillary e apenas 4% para Trump.
Em quatro países, Trump marca zero: Bolívia (91% para Hillary), Argentina e México (94% para a democrata) e Equador (95% votariam na adversária do republicano).
Permito-me uma dúvida: será que, se a pesquisa fosse feita com o público em geral, em vez de apenas com os chamados “líderes de opinião”, os resultados seriam parecidos?
A rejeição mais ou menos universal aos políticos do establishment (e Hillary é uma das mais representativas deles) sugere que a imagem (falsa) de “outsider” que Trump cultiva talvez fizesse sucesso também na América Latina.
Mas, à falta de dados científicos a respeito, fiquemos com a opinião dos “líderes”, que, ademais, parece extremamente sensata ao rejeitar Trump.
Primeiro porque é razoável supor que o preconceito contra os mexicanos, publicamente manifestado uma e outra vez, estender-se-á aos demais latinos. Não creio que Trump faça distinção entre mexicanos e brasileiros, entre guatemaltecos e colombianos e por aí vai.
Para ele, todos somos “hombres malos” (e mulheres loucas para serem agarradas pela vagina).
Preconceito não é a melhor maneira de conduzir o relacionamento diplomático. Só tende a reforçar o anti-norte-americanismo que está (ou estava) se tornando residual no subcontinente.
O presidente do Banco Central mexicano, Agustín Carstens, já está prevendo um “vendaval” sobre a economia do país, se Trump vencer. Afetará inexoravelmente toda a Aliança do Pacífico que o México integra com Chile, Peru e Colômbia e da qual o Mercosul está tentando se aproximar.
Outro elemento objetivo a considerar: a vitória de Trump sinalizará o congelamento dos acordos comerciais globais, multilaterais ou bilaterais. É verdade que Hillary também está se manifestando contra eles, mas ela é mais flexível e pragmática.
Para o Brasil, é um péssimo sinal porque ocorre justamente quando o país (e toda a região) ensaia dedicar-se aos acordos comerciais que não conseguiu fechar ou nem sequer começar a negociar nos últimos muitos anos.
Se já não bastassem esses estorvos diretos há, sempre no âmbito comercial, uma ameaça global: impor sobretaxas às importações chinesas, como Trump promete, equivale a uma declaração de guerra a que os chineses certamente responderão com idêntica agressividade.
Em um cenário econômico global já complicado, tudo de que o mundo não precisa é de um conflito entre as duas grandes potências econômico/comerciais do planeta —e que, de quebra, são os dois maiores parceiros do Brasil.
O pior é que não há nada que o Brasil possa fazer salvo torcer para que Trump não seja eleito ou, se o for, que esqueça tudo o que disse na campanha.
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