Fonte: Blog do BG
O PT sempre cantarolou que o
movimento “Lula Livre” era uma iniciativa intrinsecamente popular — bancada
pelo militante abnegado ou no máximo pelos cofres de sindicatos devotos ao
petismo — visando pressionar o Poder Judiciário a libertar o ex-presidente
Lula, que cumpre pena por corrupção desde abril do ano passado, na sede da
Polícia Federal em Curitiba. Contudo, documentos obtidos por ISTOÉ mostram que
o movimento dificilmente ficaria em pé e sua voz ecoaria Brasil afora se não
houvesse farta utilização de recursos públicos.
Prestações de contas da Executiva
Nacional petista ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre o montante
destinado ao partido pelo Fundo Partidário comprovam que o PT usou dinheiro da
União — ou seja, público — na compra de passagens aéreas, diárias de hotéis e
alimentação para os petistas irem a Curitiba pedir a soltura do ex-presidente,
no pagamento de locação de veículos, no aluguel de salas para reuniões e, até
mesmo, no custeio do trabalho de seguranças privados em atos registrados em
favor do “Lula Livre”. Em especial, no acampamento erguido próximo à sede da PF
de Curitiba.
Do bolso do petista que ostentava
estrelinha no peito e faixa rubra na cabeça saiu muito pouco ou quase nada. Já
do Fundo Partidário (uma verba pública) foi utilizado em 2018 quase R$ 1
milhão. Independentemente do valor, o importante é que princípio da lei que
rege a utilização do recurso público foi quebrado. Advogados eleitorais ouvidos
por ISTOÉ afirmam que o partido contrariou frontalmente o que determina a Lei
9.096/95 (Lei dos Partidos Políticos), já que o Fundo Partidário destina-se a
sustentar as atividades de organização meramente partidárias, não iniciativas
de promoção pessoal de seus filiados, como se verifica clara, expressa e
indiscutivelmente no movimento pela libertação do ex-presidente.
A farra das passagens
As planilhas às quais ISTOÉ teve
acesso somam aproximadamente 10 mil páginas. Elas revelam que a legenda bancou
com a verba despesas de boa parte de seus dirigentes para que eles estivessem
presentes em São Bernardo do Campo durante o ato de resistência à prisão de Lula,
na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, entre os dias 6 e 7 de abril de
2018, ou nos dias seguintes em Curitiba, para onde o petista foi levado preso.
Os gastos se estenderam a eventos que pediam a libertação do petista nos meses
de maio e começo de junho.
Muitas das viagens de
parlamentares do PT a Curitiba para visitar Lula na cadeia, como as dos
senadores Lindbergh Farias e Gleisi Hoffmann, também foram custeadas pela
União. Do mesmo modo que as despesas com deslocamentos de Fernando Haddad, ex-prefeito
de São Paulo, e da ex-presidente Dilma Rousseff, entraram na cota do dinheiro
meu, seu e nosso. Um verdadeiro acinte, para dizer o mínimo.
Os maiores gastos, sem dúvida
alguma, foram com passagens aéreas para esses militantes e dirigentes. No período
de abril a junho, quando o movimento “Lula Livre” se intensificou e ganhou
capilaridade , o partido torrou em torno de R$ 230 mil só com as viagens. Entre
os beneficiados pelas passagens aéreas estavam, além da ex-presidente Dilma
Rousseff, e do ex-prefeito e candidato a presidente derrotado Fernando Haddad,
o ex-presidente da executiva estadual do PT em São Paulo, Emídio de Souza. O
Fundo Partidário petista foi generoso ainda com integrantes de executivas
estaduais, como da Bahia e Maranhão.
Não houve pudores no gasto com a
verba do contribuinte. Por exemplo, para que ela pudesse acompanhar o ato de
resistência à prisão de Lula nos dias 6 e 7 de abril, a presidente do partido,
Gleisi Hoffmann, na época senadora, não coçou o bolso. Preferiu, claro, ter
despesas pagas no Novotel Jaraguá em São Paulo com recursos extraídos pelo PT
do fundo público. Na farra com dinheiro da União, outra figura carimbada do PT
não poderia faltar: trata-se do sempre histriônico Lindbergh Faria. Para o hoje
“Youtuber”, a hospedagem no Astron Saint Moritz, de São Bernardo do Campo, foi
inteiramente quitada pelos cofres públicos. “A utilização de recursos do fundo
partidário para a promoção pessoal de um de seus filiados, não se enquadra nas
premissas legais estabelecidas no Artigo 44 da Lei dos Partidos Políticos.
Assim, ao utilizar-se de recursos públicos, provenientes do fundo partidário,
para a promoção de filiado, o partido pode ser obrigado a ressarcir a União”,
afirma o advogado especialista em Direito Eleitoral, Francisco Emerenciano.
No caso específico de Dilma
Rousseff, o PT pagou com recurso público suas passagens de Porto Alegre a São
Paulo no dia 7 de abril para que ela pudesse acompanhar a resistência de Lula à
prisão em São Bernardo do Campo. O custo foi de R$ 701. Depois, no dia 23 de
abril, Dilma teve a passagem de Porto Alegre a Curitiba novamente custeada, no
valor de R$ 2.294, para que ela fosse à PF visitar Lula e também participar do
evento “Lula Livre” na porta da cadeia. Por ironia do destino, a tentativa de
Dilma de ver seu mentor naufragou. A Polícia Federal não permitiu o ingresso da
ex-presidente na cela do petista. Na época, a juíza Carolina Lebbos barrou 23
pedidos de visitas ao petista. Além de Dilma, na lista de pessoas que foram
visitar Lula com passagens compradas com dinheiro público constavam o
ex-prefeito de São Bernardo do Campo, Luiz Marinho, o presidente do Instituto
Lula, Paulo Okamoto, o ex-secretário de movimentos sociais do PT, Renato Simões
e Alberto Cantalice, ex-presidente do PT do Rio de Janeiro. Todos foram a
Curitiba no dia 9 de abril.
Na prestação de contas da legenda
entregue ao Tribunal Superior Eleitoral ainda são listados como gastos diretos
do partido em prol dos eventos em favor de Lula R$ 11,9 mil em segurança
privada e outros R$ 32,5 mil com a locação de veículos e vans para o
deslocamento de militantes em Curitiba nos dias seguintes à prisão do
ex-presidente. As despesas informadas ao TSE contabilizam ainda R$ 8,2 mil com
o aluguel de uma sala no hotel Dan Inn Curitiba para a realização de reuniões
dos petistas na capital paranaense. Foi incluído no montante gastos com água,
café e pães de queijo disponíveis para os militantes. Pelo visto, não faltou
comida (de graça). Gratuita para quem participou, claro, não para quem pagou —
você, o leitor que arca regiamente com seu imposto. É que na lista de despesas
com dinheiro público consta a locação de uma outra sala de encontros no hotel
Petras Flat, no valor de R$ 3,5 mil, com a disponibilização de 16 cafés
completos e 28 almoços, conforme notas fiscais obtidas por ISTOÉ.
Se houvesse conflito com
militantes adversários, o PT estava preparado, segundo revelam as planilhas.
Para escoltar os filiados, foram gastos cerca de R$ 11 mil com a contratação
extra de 32 seguranças, em um total de 353 horas de trabalho entre os dias 4,
5, 6, 13 e 14 de abril do ano passado. Tudo com dinheiro do Fundo Partidário,
cujo uso se mostra totalmente desvirtuado. Já em Curitiba, nos dias que
seguiram à prisão de Lula, os mortadelas, como ficaram conhecidos os petistas
habituês das manifestações, não tiveram problemas de locomoção. Uma verdadeira
frota de veículos encontrava-se à inteira disposição dos filiados. Nas notas às
quais ISTOÉ teve acesso, foram contabilizados sete veículos executivos (com
motoristas inclusos) e nove vans locadas por meio da empresa One Eventos. Os
automóveis não estavam a passeio: foram utilizados no deslocamento de
dirigentes do PT em Curitiba.
Na festança com dinheiro público,
há nas prestações de contas do PT ao TSE dois dados que chamam a atenção. Um
deles refere-se à realização do Congresso da Juventude Petista, nos dias 6 e 7
de junho, em Curitiba, utilizado pelos jovens para promover o “Lula Livre”. Nos
documentos apresentados, o PT relaciona as despesas de R$ 465,8 mil com o
encontro para justificar pagamentos feitos com os recursos do Fundo Partidário.
Só com as passagens aéreas para 100 militantes irem a Curitiba, o partido
gastou R$ 202,6 mil. À infraestrutura do Congresso, o partido destinou R$ 117,8
mil. Para a edição de um mero informativo, foram gastos R$ 47,5 mil, além de
outros R$ 25 mil consumidos na distribuição de camisetas vermelhas.
O outro dado que causa espécie –
pela ousadia dos dirigentes petistas — é o pagamento de despesas com a defesa
do ex-presidente Lula após a expedição do mandado de prisão. Com verba pública.
De acordo com a papelada ao qual ISTOÉ teve acesso, o advogado de Lula
Cristiano Zanin teve passagens aéreas custeadas pela Executiva Nacional do PT
em pelo menos uma das idas a Curitiba para encontros com o cliente. No dia 14
de junho, Zanin foi a Curitiba às custas do recurso a que o PT recorre do Fundo
Partidário. Quem também se valeu da verba foi o escritório Aragão e Ferraro
Advogados, que atuou em Curitiba para defender a ocupação de um espaço público
por militantes do “Lula Livre” durante uma ação de reintegração de posse
impetrada pela Prefeitura de Curitiba. Os militantes ocupavam uma área perto da
PF. Documentos relacionados ao escritório Aragão e Ferraro Advogados, que tem o
ex-ministro da Justiça de Dilma, Eugênio Aragão, como um de seus sócios,
mostram que foram gastos R$ 130 mil por mês na defesa das causas do PT. Assim
como as mobilizações do “Lula Livre”, as despesas com os advogados podem
caracterizar desvio de finalidade dos recursos do Fundo Partidário, com o
partido sujeito à rejeição de contas.
Durante as manifestações por
“Lula Livre” em Curitiba, militantes se deslocaram pela cidade a bordo de vans
luxuosas pagas pela União
Está mais do que evidente,
portanto, que o PT quer “Lula Livre”, mas sem nos livrar de arcar com a
infraestrutura para a manutenção e sustentação dos atos em favor do
ex-presidente considerado criminoso pela Justiça. Como sempre se desconfiou,
mas o PT se esmerava em negar, nem uma tenda sequer foi erguida com vaquinhas
dos filiados, mas sim com o dinheiro do contribuinte. Pelo visto, a confusão
entre o público e o privado não só fora consagrada quando o partido desfrutava
das delícias do poder. Permanece impregnada como um amálgama até hoje nas cinco
pontas da estrela da sigla.
Abaixo alguns trechos de IstoÉ
com os documentos
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