A União Europeia encerrou o primeiro trimestre de campanhas de vacinação sem cumprir um único dos objetivos que fixou. A Comissão Europeia esperava chegar a 31 de março tendo vacinado 80% da população com mais de 80 anos e 80% dos profissionais da saúde. Em ambos os casos, ficou muito aquém da meta, com apenas 27% da população mais velha e menos da metade do pessoal da saúde vacinado. A UE também não conseguiu cumprir o cronograma de distribuição de doses planejado, embora, neste caso, tenha sido por causa de falhas de fornecimento da AstraZeneca, que entregou 70 milhões de doses a menos do que o contratado. Bruxelas espera relançar as campanhas neste mês de abril e atingir a meta de 70% da população adulta vacinada no final de setembro.
Dados do Centro Europeu para Controle e Prevenção de Doenças (ECDC, na sigla em inglês) mostram que apenas 27% da população com mais de 80 anos recebeu as duas doses necessárias para obter imunidade. De acordo com o ECDC, apenas quatro dos 27 membros da UE ultrapassaram o limiar de 80% (Finlândia, Irlanda, Malta e Suécia) e outros dois (Dinamarca e Portugal) estão prestes a fazê-lo. Na Espanha, que não forneceu dados ao ECDC, pouco mais de um terço da população com mais de 80 anos recebeu ambas as doses e 70% tomou pelo menos uma.
Quanto ao setor da saúde, o ECDC dispõe de poucos dados, pois apenas 13 países enviaram informações. Esses dados indicam que 47% dos profissionais de saúde já foram vacinados e cerca de 61% receberam a primeira dose.
O lento início das campanhas de vacinação tem suscitado preocupação na maioria dos Estados-membros, sobretudo por causa do ritmo acelerado em outras partes do planeta, em particular nos EUA e no Reino Unido, onde 16% e 7,8% da população, respectivamente, já receberam as duas doses da vacina. Na UE, essa cifra se manteve em cerca de 6% no final do primeiro trimestre.
“Até o final desta semana, 107 milhões de doses vão chegar aos Estados-membros”, anunciou nesta quinta-feira a porta-voz adjunta da Comissão Europeia, Dana Spinant. O número está longe das mais de 160 milhões de doses inicialmente previstas, apesar de a BioNTech e a Moderna, duas das farmacêuticas contratadas pela Comissão Europeia, terem cumprido os fornecimentos prometidos, com 67,5 e 9,8 milhões, respectivamente. Já a AstraZeneca entregou 29,7 milhões, longe dos quase 100 milhões acertados.
A falta de doses se juntou à hesitação de algumas autoridades nacionais sobre o uso da vacina da AstraZeneca, que em vários países foi restringida a determinadas faixas etárias, apesar de a Agência Europeia de Medicamentos a considerar segura para todas as idades. Por fim, a combinação de problemas em torno do laboratório anglo-sueco deixou a UE muito distante dos objetivos que havia traçado no início das campanhas de vacinação, iniciadas em 27 de dezembro. “Claro, todos nós sabemos que poderia ter sido muito mais rápido se todas as empresas farmacêuticas tivessem cumprido seus contratos”, lamentou a presidenta da Comissão, Ursula von der Leyen, fazendo um balanço do primeiro trimestre da campanha durante a cúpula europeia realizada na semana passada.
“Incremento substancial da produção”
Apesar do solavanco inicial, o comissário europeu de Mercado Interno, Thierry Breton, responsável pelo redirecionamento das campanhas, considera que já existe “um aumento substancial da produção”. E nesta quarta-feira se mostrou convencido de que “em meados de julho estaremos em condições de entregar aos Estados-membros doses suficientes para obter imunidade coletiva, desde que, é claro, sejam injetadas”.
A comissária europeia para a Saúde, Stella Kyriakides, destaca a previsão de que as entregas “tripliquem nos próximos meses”. E considera “alcançável” a meta de vacinar 70% da população adulta (365 milhões de habitantes) antes do final de setembro, ou seja, 255 milhões de pessoas. Fontes do bloco europeu estimam que no final de junho cerca de 60% da população adulta já estará vacinada nos quatro Estados da UE com mais habitantes (Alemanha, França, Itália e Espanha).
A Comissão Europeia de Von der Leyen joga grande parte de sua credibilidade no sucesso das campanhas, que são nacionais, mas organizadas de maneira centralizada. O órgão comunitário assumiu a tarefa de negociar com várias empresas farmacêuticas o preço e o número de doses das futuras vacinas para garantir que todos os Estados-Membros recebessem os imunizantes ao mesmo tempo, independentemente do seu tamanho ou riqueza.
Bruxelas encerrou com sucesso esta primeira fase e pôs à disposição dos Estados um portfólio de vacinas de até 2,3 bilhões de doses reservadas com cinco laboratórios, dos quais quatro (BioNTech/Pfizer, Moderna, AstraZeneca e Janssen) já possuem o produto autorizado e um (Curevac) está espera do aval. O segundo trimestre, segundo a Comissão, permitirá um aumento substancial do ritmo de distribuição, com 200 milhões de doses da BioNTech/Pfizer, 55 milhões da Janssen e 35 milhões da Moderna. A AstraZeneca irá novamente descumprir sua parte e planeja entregar apenas 70 milhões dos 180 milhões contratados. Mesmo assim, a Comissão Europeia estima que os Estados receberão cerca de 360 milhões de doses e observa que o imunizante da Janssen requer apenas uma aplicação para ser eficaz, o que ajudará a acelerar o número de pessoas vacinadas.
A Comissão recorda também que a UE manteve abertos os canais de exportação de vacinas, ao contrário dos EUA e do Reino Unido. Bruxelas impôs um sistema de controle de exportação no final de janeiro, mas até agora apenas deteve a saída de uma remessa de 250.000 doses da AstraZeneca e permitiu o envio para 41 países de um total de 68,3 milhões.
Fontes da comunidade também destacam o sucesso da vacina desenvolvida pelo laboratório alemão BioNTech em colaboração com a norte-americana Pfizer. Seu produto, batizado de Comirnaty, se tornou uma parte essencial das campanhas de vacinação tanto na UE como nos EUA e no Reino Unido. O sucesso da nova tecnologia de mRNA catapultou a BioNTech, que no último trimestre de 2020 multiplicou por 12 o seu faturamento em relação ao mesmo trimestre do ano anterior. A pequena empresa fundada em 2008 pode tornar-se um dos maiores sucessos empresariais europeus dos últimos anos se a produção e o uso de sua vacina não sofrerem contratempos.
El País
0 Comentários