VINÍCIUS SEGALLA
DO UOL, EM
SÃO PAULO
O deputado estadual Oscar Bezerra (PSB/MT), presidente da CPI das Obras da Copa em Cuiabá, que pediu a contratação da empresa |
A
contratação foi encomendada pelo presidente da CPI (comissão parlamentar de
Inquérito) instaurada na Casa para apurar os indícios de corrupção nas
empreitadas, deputado Oscar Bezerra (PSB).
Na
tarde desta terça-feira, o MP-MT (Ministério Público de Mato Grosso) protocolou
ao presidente da Assembleia, deputado Guilherme Maluf (PSDB), para que declare
nulo o contrato assinado com a empresa auditora de fachada, chamada CLS
Consultoria e Assessoria Ltda., em um intervalo de 24 horas, sob o risco de uma
ação judicial por improbidade administrativa, que não está descartada nem mesmo
com a anulação do contrato.
O
deputado Maluf, após já ter autorizado o início das atividades, já acatou a
notificação do MP. Já o presidente da CPI disse que esta parece ser uma manobra
para atrapalhar os trabalhos da CPI (Veja mais abaixo).
Orçadas
inicialmente em R$ 11 bilhões, as obras planejadas para a Copa do Mundo em
Cuiabá estouraram em muito o orçamento e o cronograma, além de apresentarem
irregularidades e suspeitas de corrupção. Apenas em uma delas, de um sistema de
VLT (Veículo Leve sobre Trilhos), há suspeita de desvios na ordem de R$ 100
milhões.
A
CLS Consultoria assinou um contrato de R$ 973 mil com a Assembleia Legislativa,
mesmo depois que a própria procuradoria geral da Casa publicou parecer
contrário à contratação. A empresa foi aberta no dia 16 de janeiro de 2012, e
suas instalações resumem-se a uma sala comercial em um prédio na rua 12 de
Outubro, número 273 (sala C). No mesmo imóvel, funcionam, teoricamente, mais
oito empresas, todas de consultoria ou contabilidade.
Sem
capital, sem empregados e sem registro
Conforme
informações da Relação Anual de Informações Sociais (Rais, prestada pela
empresa anualmente ao Ministério do Trabalho), a CSL declara que jamais esteve
em atividade desde a data de sua abertura, em janeiro de 2012.
As
guias de recolhimento da empresa até fevereiro de 2015 informam o código o 115
(ausência de fato gerador –sem movimento). Em outras palavras, a empresa não
estava em atividade antes de sua contratação pela Assembleia Legislativa de
Mato Grosso. A Rais evidência que a empresa jamais teve um funcionário
registrado desde a data de sua abertura;
Além
disso, em que pese a CLS ter sido contratada para a prestação de serviços na
área de engenharia, a empresa não possui registro no Crea/MT (Conselho Regional
de Engenharia), o que a inabilita a realizar quaisquer serviços na área de
engenharia, serviços estes efetivamente previstos no Termo de Referência da
Dispensa de Licitação n.º 03/2015, que balizou a contratação da consultoria.
Isso
quer dizer que, na data da contratação, a CLS, se existisse, seria inapta
tecnicamente para a prestação de serviços na área de engenharia. O presidente
da CPI, deputado Oscar Bezerra, foi informado sobre tal fato, mas nada fez a
respeito.
A
ausência de registro da empresa no Crea já foi objeto de questionamento à
Assembleia Legislativa pelo Crea/MT, por meio do Ofício n.º 124/Presidência, de
26 de maio de 2015. Nesse documento, o Presidente do Crea/MT destaca que a CLS
não possui registro e que o seu objeto social não guarda qualquer relação com
as atividades ligadas à engenharia.
As
fragilidades da empresa fantasma não param por aí. A análise do Balanço
Patrimonial da CLS evidencia que seu capital social é de apenas R$ 15 mil,
correspondente a 1,5% do valor global da contratação.
Nas
licitações públicas realizadas com amparo na Lei n.º 8.666/93 (Lei de
Licitações) exige-se que a empresa possua capital social ou patrimônio líquido
mínimo de 10% em relação ao valor global estimado da contratação. Empresas que
não satisfaçam tais exigências, em geral, são consideradas inaptas, sob o ponto
de vista econômico-financeiro, para serem declaradas habilitadas nas
contratações públicas.
A
análise do balanço patrimonial da empresa ainda evidencia outras situações que
demonstram a fragilidade econômico-financeira da empresa. Não há registros de
direitos a receber (clientes). Não há nenhum valor registrado no imobilizado da
empresa, bens móveis ou disponibilidades financeiras em bancos.
O
único valor registrado no Ativo consta da conta Caixa Econômica Federal no
valor de R$ 15.868,80. O Balanço Patrimonial da empresa se assemelha mais a um
balanço de abertura do que propriamente a uma empresa que esteja em plena
atividade.
No
Passivo constam registros em exigibilidades com impostos e contribuições a
recolher (R$ 868,80), Obrigações Trabalhistas e Sociais (R$ 224,44) e outras
obrigações (R$ 644,36). Embora a empresa registre em seu passivo exigibilidade
relativa à obrigação trabalhista, a CLS não possui nenhum funcionário com
carteira assinada, situação esta caracterizada desde a data de sua abertura.
A
Demonstração de Resultado de Exercício da empresa informa que a CLS teve uma
receita por venda de serviços no ano de 2014 de R$ 52.850,29. Essa receita pode
ser considerada irrisória frente ao valor global da contratação, de R$
973.347,74, correspondente a apenas 5% desse valor.
Na
prática, a CLS foi contratada para executar em 130 dias um contrato que possui
valor global 18 vezes maior do que o total supostamente faturado pela empresa
nos 365 dias do ano de 2014.
Escolha
arbitrária
A
CSL foi contratada em regime emergencial, com dispensa de licitação, mas isso
não quer dizer que o órgão público contratante possa escolher a empresa que
quiser para realizar o trabalho. Além de verificar os trabalhos anteriores da
empresa contratada e se a ordem de grandeza de seu capital é compatível ao
trabalho contratado (o que, como se nota, não foi feito), o órgão público é
obrigado a realizar uma pesquisa de mercado para balizar o valor de contrato.
isso não foi feito.
A
própria Procuradoria Geral da Assembleia apontou para este fato, mas o
presidente da CPI, Oscar Bezerra, deu de ombros ao parecer jurídico produzido
pela pelos especialistas contratados pela Casa. Um trecho deste documento
desaprovando a contratação pode ser visto abaixo:
Todos
esses problemas foram passados ao presidente da CPI, deputado Bezerra, no dia 5
de maio deste ano. O parlamentar assim respondeu, no dia 8 de maio, aos
técnicos do legislativo mato-grossense: "A CLS atende plenamente os
requisitos de habilitação, e conforme documentos apresentados pela referida
empresa, pudemos denotar que a empresa possui condições específicas,
necessárias e suficientes para o desempenho dos serviços sob a égide desta
Comissão Parlamentar de Inquérito."
Nesta
terça-feira, o parlamentar falou à imprensa sobre a iniciativa do Ministério
Público de querer anular o contrato com a empresa fantasma. Para o deputado,
tudo não passa de perseguição para obstruir os trabalhos da CPI: "Preciso
entender se a intenção é paralisar a CPI. Se essa for a intenção, tem que ter
coragem de convocar a mídia e dizer. Eu acredito que possa ter um boicote nisso
tudo".
Ao
UOL Esporte, o Ministério Público de Mato Grosso afirmou que está investigando
a contratação, considerada "muito suspeita", e que tomará as medidas
jurídicas cabíveis nas próximas semanas. Leia mais AQUI.
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