O tema ‘Execução provisória da pena nas condenações do Tribunal do Júri’ causou diversidade de pensamentos entre os juristas que discutiram o assunto durante o encontro Pacote Anticrime: Avanços ou Retrocessos, realizado nos dias 4 e 5 de agosto, na comarca de Chapada dos Guimarães. A mesa foi composta pelo desembargador Gilberto Giraldelli (presidente), o advogado Ulisses Rabaneda (painelista) e o defensor público Fernando Soubhia (debatedor) que acreditam ser uma involução a reforma trazida pelo pacote anticrime. Diferentemente, o promotor de justiça Antônio Sérgio Piedade classifica como progresso.
Durante a apresentação do tema, Rabaneda explicou que a Previsão de uma execução antecipada de uma condenação no tribunal do júri viola a cláusula constitucional da presunção de inocência. Ressaltou ainda que “o Supremo Tribunal Federal já debateu esse tema nas ações declaratórias 43 e 44 e entendeu que a pena só pode ser executada após transitado em julgado a sentença condenatória. Isso não significa que o réu não pode ser preso no curso do processo. Ele pode. Desde que haja os requisitos da prisão preventiva.”
Ainda segundo o painelista, mandar ao cárcere alguém que ainda não tem uma sentença definitiva é um retrocesso. “A lei prevê, mas hoje, nesse encontro, a maioria dos componentes do painel sufragou que ela é inconstitucional. Houve por parte do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) uma ação direta de inconstitucionalidade que pende de julgamento. Cabe agora ao Supremo Tribunal Federal dizer se ela é constitucional ou não. Em meu entendimento nesse ponto, ela é um retrocesso.”
Desembargador Gilberto Giraldelli apontou os palestrantes como renomados e capacitados para discutir o assunto e explicou que, “por maioria, foi entendido que é inconstitucional exatamente porque no entender dos debatedores, ela feriria o princípio maior da presunção de não culpabilidade de todo e qualquer cidadão.” Ainda segundo o magistrado, em Mato Grosso, o Tribunal de Justiça está aguardando uma decisão mais definitiva sobre o tema por meio do STF. “A última palavra em constitucionalidade é do Supremo Tribunal Federal. Enquanto isso, estamos julgando de acordo com normas infraconstitucionais, no caso, a do Superior Tribunal de Justiça que vem também sufragando esse posicionamento de que a prisão decorrente da condenação do tribunal do júri por si só não é suficiente para dar início ao cumprimento da pena.”
Fernando Soubhia, que representava a defensoria pública, também enfatizou que a prisão, quase que imediata, após a condenação pelo tribunal do júri se configura um retrocesso no panorama normativo. “Ela não se justifica em termos práticos. Em minha opinião, não reduz a violência, no máximo ela comunica à sociedade que as pessoas saíram presas do tribunal do júri. Apenas aumenta o número de presos. Mais do que isso, normativamente ela não se justifica. Dentro de nossa estrutura normativa, o nosso Código Penal tem previsão para que aquela pessoa que representa um risco à sociedade seja mantida presa. Isso é uma cautelaridade. Então, qualquer prisão que anteceda o trânsito em julgado e não tenha um fundamento cautelar é arbitrária e inserir essa possibilidade no código é um grande retrocesso em minha opinião.”
Do outro lado, o promotor Antônio Sérgio Piedade aponta a execução provisória da pena nas condenações do tribunal do júri como um avanço. Ele salienta que o tribunal do júri é soberano então, se a pessoa é absolvida, é solta imediatamente. Por outro lado, a pessoa condenada, é presa imediatamente. “O grande problema é que temos uma recorribilidade limitada na apelação do tribunal do júri. Um juízo monocrático, o tribunal pode em sua integralidade alterar um conteúdo decisório. No júri, não. Caso a decisão seja contrária, mas manifestamente não contrária à prova dos autos, aí sim o tribunal pode anular. Percebemos que estatisticamente o número de anulação pelo artigo 593 é ínfimo. Até porque temos uma filtragem dos procedimentos do júri. Havendo uma pronúncia e nenhuma prova posterior à pronúncia de forma a ilidir essa vertente probatória no sentido daquilo catalogado pelo Ministério Público: denúncia recebida, pronúncia, muitas vezes a pronúncia mantida em sede de recurso em sentido estrito. Há uma plausibilidade.”
Ainda segundo ele, o “grande problema” é que o sistema precisa de efetividade. “Viola o sentimento de justiça você ver o réu condenado em crime de homicídio, um crime grave, um crime de sangue, sair pela mesma porta dos familiares da vítima. Isso gera uma indignação. Então, temos um processo com uma filtragem muito grande. Em sendo condenado o réu, o júri é soberano e ele vai ser preso. Evidentemente que há um poder de cautela por parte do juiz e em uma decisão excepcional pode-se conceder uma liminar ou ordem de habeas corpus de modo que o indivíduo aguarde em liberdade. Esse é o ponto. É dotar o sistema de efetividade e garantir equilíbrio e proteção de modo que a gente não tenha uma proteção insuficiente. O Brasil vem sendo condenado reiteradamente na Corte Interamericana de Direitos Humanos não pelo excesso, mas por não punir, pela insuficiência de proteção.”
Por fim, ele ressaltou que a matéria vem sendo debatida no Supremo Tribunal Federal, no tema 1068. O ministro Roberto Barroso e o ministro Dias Toffoli já se posicionaram acerca da possibilidade da execução imediata no tribunal de júri. O voto do ministro Gilmar Mendes ao contrário e o ministro Ricardo Levandowski está com vista do processo.
Keila Maressa/ Fotos: Bruno Lopes
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